terça-feira, novembro 01, 2005

Muito obrigado

O meu cupincha
entrou lá em casa sem pedir licença,
olhou pra mim com cara tensa e amarrada
como se eu fosse um sujeito chinfrim,
debaixo do meu nariz e sem dizer nada,
deu um amasso
e chamou minha patroa na chincha,
e a patroa ainda pediu bis,
depois,
sem fazer cerimônia,
calçou meu chinelo,
vestiu meu roupão amarelo
e tomou conta do banheiro,
fez barba com minha navalha,
ficou um tempão
se esbaldando com a patroa no chuveiro
e se enxugaram na minha toalha,
passou meu desodorante no sovaco
sem a menor parcimônia
e até no saco botou minha água de colônia,
pra culminar,
pôs debaixo do braço e levou a patroa,
conquanto eu não ache explicação,
em vez de sair em prantos,
ele saiu sorrindo!,
garantindo que aquilo ia dar o que falar,
mas, antes de sair,
me disse poucas e boas,
e foi direto contar o feito à vizinhança,
enfeitando ainda mais o pavão,
pegou a molecada
pra divulgar o fato de porta em porta
em troca de uns trocados,
alugou um carro de som
pra propagar em altos brados a façanha,
entremeando a divulgação com música sertaneja,
se gabou e contou vantagem no boteco da esquina,
deu entrevista às revistas Seja e Gente Fina,
editadas pela turma lá da rua,
e a ex-patroa pousou nua,
ele espalhou faixa e distribuiu panfleto
em pleno coreto da praça,
provocou um estouro no caixa do showmício
do candidato a presidente do bloco
“Não Troco Nem Por Ouro
Meu Diploma de Corno Vitalício”,
foi convidado pra fazer de graça
o comercial da cerveja
fabricada no quintal da quitandinha,
deu autógrafo em calcinha e sutiã
de fãs de mais idade,
na verdade,
meu cupincha ficou tão deslumbrado,
que me fez passar por mal educado
pois não me deu nem tempo
de lhe dizer muito obrigado,
muito menos,
de falar pra todo mundo
que vou mandar alianças,
sogra, cunhados e as crianças,
e abrir uma poupança em seu nome
com o dobro da pensão que devia pagar,
pra que possam viver numa boa
e nunca passem fome,
e, tendo sempre fundos,
nunca pense em devolver a ex-patroa!