sábado, novembro 05, 2005

O conselho do Drummond!

Pelo jeito,
o tempo não muda,
não muda a hora,
ninguém se atrasa ou demora
mais do que é preciso,
quem chega,
mais dia, menos dia,
vai embora,
e sem aviso,
portanto,
sujeito,
tome tento,
deixe seu cavalo no meio chuva,
se molhe,
tire os óculos escuros,
olhe,
veja as cores naturais,
ajeite nas costas o arreio,
se há carga de mais
e embarga os movimentos,
por que não a despeja?!,
tire o pé desse freio
que o deixa parado
e cheio de medo
em cima do muro,
sem esquecer
que a virtude está no meio,
dê-se conta dos dois lados,
das duas pontas,
afinal,
se há certa amplitude,
não deve ser à toa,
se pode não ser boa,
pode também não ser ruim,
e, enquanto você fica assim,
fixado em luvas, réis e anéis,
esquece os dedos,
e as raposas o fazem de bobo,
pegam suas uvas,
e os lobos vão atrás da sua esposa,
e nenhum deles tem pudor,
e o rondam, doutor, as saúvas,
num piscar de olhos o trituram,
já trituraram tantos feito você,
com esse mesmo jeito,
com essa mesma arrogância
que, em última instância,
é falta de sensatez,
pois não cabe muito bem
em que precisa ser freguês
de várias refeições diárias,
vitaminas, proteínas, sais minerais,
não cabe muito bem
em quem tem
aquelas necessidades
que aumentam com a idade,
e que, digamos assim,
são um tanto prosaicas,
tão arcaicas
quão o mais arcaico
exemplar da sua raça,
uma lição exemplar
pra quem é capaz de aprender,
falo daquelas necessidades
que o ser civilizado
faz questão de dizer
que não faz no meio da praça,
embora ali faça
negócios bem mais feios, bem piores,
e com maiores e menores,
meu irmão,
já que o tempo não pára,
o relógio dispara
e nenhum tem eterna garantia,
aproveite cada dia da viagem
e siga o conselho ladino
que ao Sabino deu o Drummond:
“caia na sacanagem!”;
se não achar de bom-tom
cair de corpo e alma
por considerar muito louco
e preferir um pouco mais de calma,
caia de cara!