sexta-feira, janeiro 02, 2009

Vivo no prego

Vivo no prego
e não nego que vivo
que a bacana
não sou metido
e ao fasto
não sou chegado,
e a grana é curta
e o gasto é comprido,
e minha gente
não furta nem afana,
agora mesmo,
rependurei
pendura do passado
e juntei
ao vasto passivo
despesa do presente
que meu ativo
é pra inglês ver,
não dá pra viver
nem metade do mês,
e, com certeza,
um pendura recente
com algum do futuro
vai ter de ser rependurado,
na verdade,
nem mesmo
na hora de cochilar
passo sem pendura
e faço como se faz
em xadrez superlotado,
penduro uma alça
e me dependuro
que no chão
não há mais lugar,
de maneira a secar
pra usar de manhãzinha,
penduro
a calça cansada
e o blusão destinto
atrás da geladeira
branca e vazia
que angustia e atravanca
o recinto acanhado
que é sala, quarto e cozinha,
mas,
quando se instala o verão,
de porta escancarada,
dá pra utilizar
tal qual ar-condicionado,
e me penduro no frio
que não é farto nem corta,
mas,
me dá arrepio
que careço de costume,
pra ver televisão,
o preço
é me esticar
e ficar pendurado
no som da casa ao lado
que vaza o meu tapume
e adentra minha moradia,
e a fantasia entra em ação,
e o volume
até que é bem bom,
que a audição da vizinha
já não vai lá muito bem,
e, pelo passadio,
eu apelo,
falo macio e repriso
aquele sorriso
amarelo e oco
e não me abalo
nem dou um pio
quando o comerciante,
à guisa de troco,
me pisa e afronta
diante da freguesia,
e o meu brio
com a conta penduro,
e penduro
pelo pão na padaria,
na mercearia,
por arroz, feijão e farinha,
e, na tendinha,
por nobre razão,
pela purinha e pela loura,
que estoura o pobre
sem esse bendito pendura,
pra ir e vir do batente,
aturo aflito
a loucura do dia-a-dia
e me penduro na condução,
mas,
antes de sair,
pra escapar
de crime e acidente,
me penduro
na mão da santa
e é tanta a minha fobia
que penduro em mim
cordão chinfrim
com figa e patuá,
e tive de tirar do quintal
e de pendurar na casinha
a bandeira do meu time
que o pessoal,
pra pisar no meu calo,
deu de chamá-lo de poeira
porque não vive sem lanterninha,
enfim,
essa briga
é uma pedreira
que o prego não é mole,
mas,
apesar da sua censura,
me nego
a pendurar a chuteira,
minha prole que o diga,
e é desnecessário
vir em meu auxílio
falando de camisinha
que tal utensílio
nenhum boticário pendura!