terça-feira, janeiro 31, 2006

Ah... que saudade!

Ah... que saudade
do disco na vitrola,
“Tu me acostumbraste...”,
ah... que saudade
do engaste na penumbra
disputada palmo a palmo
pelo esbarra-esbarra dos casais,
ah... que saudade
dos Metais em Brasa,
e que brasa, e que metais!,
ah... que saudade
do oba-oba em braile,
o baile da mão-boba
sob a gola farta do vestido
ou sob o xaile
que fingia ser de marta,
ah... que saudade
do sussurro ao ouvido,
apesar do risco
de levar murro de irmão
ou, então,
de passar vexame,
um instante antes
de botar a mão no bolso,
ser apanhado em flagrante
pelo detalhado exame da tia
que ficou pra titia e de prontidão,
ah... que saudade,
moço!

Já tá bom demais!

Se não escassear a mulata,
não baquear o samba,
não rarear a cerveja,
caramba!,
já tá bom demais!,
aí,
não faz diferença não
se minha equipe querida
bordeja de madrugada,
não peleja no treino,
dá a partida de bandeja
e então não ganha,
só apanha ou empata;
aí,
não faz diferença não
se a filha e a patroa,
quando saio do reino,
fazem uma dupla boa
e a esperta dupla
decupla a renda da família
exercitando certas pendas;
aí,
não faz diferença não
se de forma bizarra
e contra a norma
na marra se adiou a data
pra tomar a decisão
se se pune ou não a nata
atolada em muamba;
ou seja,
se não rarear a cerveja,
não baquear o samba,
não escassear a mulata,
caramba!,
já tá bom demais!

É... deu a louca no almanaque!

De fraque e cartola,
o Tarzã deita e rola
na porta de uma boate
e mora com uma dona
que tem uma irmã
que adora um cipó
e não se importa
que ele a chame de Jane;
sem a capa
e sem o mapa da mina,
o Mandraque teve pane
e acabou dando um nó
num jogo da segundona,
não arranjou o empate
e foi fazer faxina no xilindró
porque já levara a peita;
virou motobói o Jerônimo,
mas ainda não aceita
não ser mais herói
porque o sertão virou mar
como previa a canção
e ele não aprendeu a nadar,
e vive com crise de asma,
de ansiedade e de saudade;
por causa de um homógrafo...
melhor dizendo,
homônimo sem censura,
o Fantasma teve um baque,
noto que não há mais claque
pra lhe pedir autógrafo
nem fotógrafo
querendo tirar foto da figura;
é...
deu a louca no almanaque!

sábado, janeiro 28, 2006

Capitão-do-mato

Capitão-do-mato,
caçador de pegada e pista,
faro de cão, ouvido raro, vista aguçada,
capitão-do-mato,
bandido coração
indiferente à dor daquela gente,
chapéu na cabeça, garrucha na cinta,
sangue e rebenque na mão,
chapéu na cabeça, garrucha na cinta,
sangue e rebenque na mão
,
capitão-do-mato e o cupincha,
Cruel, um alazão
que empina, escoicinha e relincha
sem ver serpente pela frente
que sente o veneno que vem da sela;
capitão-do-mato,
caçador de pegada e pista,
faro de cão, ouvido raro, vista aguçada,
capitão-do-mato,
bandido coração
indiferente à dor daquela gente,
chapéu na cabeça, garrucha na cinta,
sangue e rebenque na mão,
chapéu na cabeça, garrucha na cinta,
sangue e rebenque na mão
,
capitão-do-mato e fila Feroz,
fiel e sanguinário,
que nunca late, focinha e abate,
abocanha ao sabor da sanha,
do veneno que o sicário algoz destila;
capitão-do-mato,
caçador de pegada e pista,
faro de cão, ouvido raro, vista aguçada,
capitão-do-mato,
bandido coração
indiferente à dor daquela gente,
chapéu na cabeça, garrucha na cinta,
sangue e rebenque na mão,
chapéu na cabeça, garrucha na cinta,

sangue e rebenque na mão!

Só pode ser praga de madrinha

Ouço atento
conselho e sugestão
de moço, adulto e ancião,
até o espelho consulto
prestando muita atenção,
e tento,
enfrento cada opção,
e o que posso faço
pra ver se vejo
solução ou manobra
pra botar o barco no mar
e meter o arco,
e me safar de vez
do abraço de cobra
e do beijo de dragão,
mas,
fico tenso e me arraso
quando penso acerca
da perca do apartamento
e do pagamento da pensão!,
e aí fico na minha!,
esse nó
só pode ser
praga de madrinha,
que obra do acaso
não é não!

Que mandinga você frez pra mim?!

Minha nossa!,
moça,
que joça de mossa
você fez em mim!,
me deixou assim...
sem bossa
e metido na foça!,
minha nossa!,
moça,
nossa palhoça,
sem seu encanto,
perdeu a graça,
e perdi raça
e razão pra fazer troça,
agora,
por todo canto
há poça de pranto,
e já me levanto moído
como se tivesse
recebido uma coça,
minha nossa!,
moça,
até quando me apanho
diante do meu santo,
me acanho
de um jeito esquisito
e fico aflito
como se estivesse
frente a um estranho
e me roça
um arrepio tamanho
que faço
oração às avessas,
com pressa e imprecação,
nesse meu dia-a-dia
à-toa e chinfrim,
não tenho apetite
nem topo convite
prum copo de boa pinga!,
moça,
minha nossa!,
que mandinga você fez pra mim?!

quinta-feira, janeiro 26, 2006

Você está pensando que berimbau é gaita?!

Moço,
você está pensando
que berimbau é gaita?!,
se está...
está se enfiando
numa baita confusão!,
que berimbau
não é gaita não,
também do bolso
pode ser a gaita
e berimbau não pode não,
se quiser confirmação,
quando vier
a conta do almoço,
apresente o berimbau!
e veja a repercussão!,
ou seja,
a percussão da sua lata
na pata do gerente ou do garçom!

Meus Santos tomam conta de mim

Sou prolixo,
é muito confusa
minha argumentação
e me fixo
no que não é importante
quando dou explicação,
fico perplexo
diante de mera indagação
e o nexo já era,
minha conclusão
é simplória e difusa
e não é persuasiva o bastante,
não sou bom em evasiva,
escapatória ou escusa,
qualquer recusa
abala minha estrutura,
criatura estranha
me deixa sem fala
e mulher me acanha,
encabula e deixa tonto,
e tanto,
que faço firula idiota
e acabo entregando os pontos,
fico pálido
quando conto lorota,
esquálido quando minto
e rubro quando falo besteira,
fico disperso
e sinto tremedeira
em entrevista e discurso,
mas,
quando dou curso à inspiração
e descubro o artista,
meus Santos tomam conta de mim,
e aí fico assim,
solto!,
de todo envolto
no verso e na canção!

Dia morno

Dia morno,
dia sem estorno
na conta corrente,
nem crédito, nem débito,
dia de intuito
muito claro e conciso,
pista sem acidente
de ponta a ponta,
seja fortuito convexo
ou côncavo gratuito,
dia de plena visão
e sem reflexo
que perturbe a vista
pra não ser preciso
faro ou intuição,
um dia liso
em que não se tropeça em nada,
em que nada ocorre às avessas,
em que cada coisa está
no seu devido lugar,
mas,
não tão liso
que faça escorregar,
dia em que não se corre
porque não se está
premido pela pressa,
dia em que não se frena
porque não vale a pena,
não compensa ir devagar;
aliás,
um dia a mais,
mais um dia
que não faz diferença!

quarta-feira, janeiro 25, 2006

A quem interessar possa

A quem interessar possa:
se der,
prenda com barbante e durex,
se não der,
não seja otário,
seja astuto,
se renda ao “dura lex sed lex
e se concentre na solução,
use e abuse de produto
com efeito
contrário ao do laxante,
ou seja,
que não tenha sido feito
pra dar jeito
em prisão de ventre,
e toque o bonde
por onde for preciso,
mas,
um aviso:
não coloque a carroça
na frente dos burros,
não chute o pau da barraca,
não lute contra a maré,
não enfie os pés pelas mãos
nem dê murro em ponta de faca,
e não tente dar coça
se só puder dar palmada,
até uma somente,
mas bem dada,
também,
não entre nessa
de cantar vitória antes,
é besteira,
e lembre a lição antiga:
a pressa é inimiga da perfeição!;
agora,
se não estiver aqui a solução
e não quiser
pendurar a chuteira,
está na hora do implante!

terça-feira, janeiro 24, 2006

Faça graça na raça

Por favor,
não espere permissão da razão
pra fazer graça,
coloque de banda o juízo,
ditador cheio de estratégias
que sabota a emoção
por inveja do poder do sorriso,
anda,
bota a mão na massa
e libere a nota engraçada
que o coração melodia
e faz tanto bem,
vem,
inspire euforia,
expire palhaçada,
deixe de lado a arena,
com cargo e agenda,
troque o colarinho apertado
por um bem largo,
se renda ao palhaço,
deixe que ele abra caminho
e entre em cena no picadeiro,
que o palhaço é o bombeiro
que apaga mágoas,
alaga o coração de alegria
e desvenda a beleza
que se escondia atrás da fumaça,
vamos lá,
abrande a expressão séria,
dê ensejo ao chiste,
despiste a tristeza
com um gracejo,
mande ver na pilhéria,
pra conseguir sorrir,
apele até pra chalaça,
mas,
por gentileza,
não entre nessa
de pedir permissão à razão,
faça graça na raça,
que tudo passa muito depressa!

Eu sou a que tem fome de ti

Eu sou a que tem fome de ti,
a que te come
quando beija tua boca,
mas,
não me tomes por louca
nem por fera,
eu sou a que te ama,
a que te espera de braços abertos,
a que está por perto quando chamas,
a que geme quando queres,
a que não teme ser várias mulheres
pra te dar bandidos prazeres
e saciar teus quereres invertidos,
eu sou a que tem fome de ti,
a que te come
quando beija tua boca,
mas,
não me tomes por louca
nem por fera,
eu sou a que se desespera
com tua ausência,
a que se magoa com teu desprezo,
a que tolera
a violência de teus piores vezos,
a que se escancara e se presta
às tuas taras,
aos teus intentos mais ferozes,
e não contesta
nem quando ecoas
teus mais atrozes xingamentos,
eu sou assim,
só quero que gozes,
mas que gozes em mim!

segunda-feira, janeiro 23, 2006

Branco azulejo

Sendo muito franco,
nosso beijo
virou branco azulejo,
frio, sem graça e sem mistério,
nosso beijo
já não ameaça
nos arrancar do sério,
o bom senso
já não esgarça
nem descompassa o peito
com aquele calor intenso,
nosso beijo
perdeu o jeito,
não dá mais arrepio
e dos lábios já não passa,
nosso beijo
agora é beijo comum,
um beijo de senhora e senhor
sem sabor nenhum
e já não nos abrasa a boca,
não tem mais aquele ardor
que só se satisfaz
quando a alma fica louca,
não é mais um beijo voraz,
beijo que faz o coração
bater demais
no afã de dar mais um beijo,
aliás,
nosso beijo
nem mais tem
a malícia do beijo,
virou carícia calma de irmã e irmão!

sexta-feira, janeiro 20, 2006

Fiz esse samba torto...

Fiz esse samba torto...
simples mortal
em pauta torta
não faz samba certo,
simples mortal
só faz certo samba...
samba desfeito
que vai ao sabor da pauta
quando o amargor
aporta no peito
e entorta a inspiração,
e samba que nasce torto,
assim como o pau,
direito não fica não
pois qualquer emenda
sai pior do que o soneto,
mas,
quando você me interpela
pra saber
por que me meto
a gemer um samba
que não se concerta,
do meu jeito aberto,
respondo assim:
depois que ela
me deixou a descoberto,
nada mais presta,
por isso pus à venda
o que resta de mim,
e aceito qualquer oferta!

"Leitoa assanhada"

Estava no menu:
“leitoa assanhada”,
e arrumei o maior rebu!,
em vez de ficar na minha
e de esperar o garçom,
pedi informação
ao grandão da mesa vizinha,
que furada!,
o sujeito se chamava Leitão!,
foi como ligar pro zôo
e pedir pra falar com seu Leão!,
inda bem que não me deu porrada;
mas,
não tenho jeito,
de quando em quando,
faço um vôo malfeito
e esbarro em confusão!;
um patrício chamado Idalício
trazia no colo seu filhinho
quando me pediu
pra consertar-lhe o autocarro,
eu disse que ia sangrar o burrinho,
e por pouco não sangro eu!;
parece louco,
mas tem mais,
eu não puxo mas sai
com intensidade e em falsete:
‘uai’, pra mineiro,
‘porra, meu’, pra paulista
e ‘barbaridade, tchê’, pra gaúcho,
nem precisava dizer
que vira e mexe entro no cacete!;
e não é só,
sou useiro e vezeiro
em fazer coisa bem pior;
eias a mais absurda da lista:
quando estou sonhando,
falo nome de mulher,
e Apolônia,
minha cara-metade,
além de não ser surda,
sofre de insônia!

quinta-feira, janeiro 19, 2006

Não dá mais não!

Do jeito que tá,
não dá mais não!,
chega de não ter
pá, chã nem acém,
chega de viver de hipocrisia,
de ‘um dia... quem sabe!,
hoje ainda não cabe...’
‘amanhã?!,
talvez...’
chega de tanta alta,
de cem por cento de aumento
a torto e a direito
e de falta de previsão no orçamento
quando chega a minha vez,
basta de andar mais esquecido
que pasta em arquivo morto,
de pagar o pato pelo malfeito,
mesmo sem dar motivo,
de ficar passando pelo crivo
de ladrão e de milícia!,
chega de levar gato por lebre,
casebre por morada,
porrada por carícia,
do jeito que tá,
não dá mais não!,
chega dessa sua abobrinha!,
e quero as minhas
com a devida correção
e meu quinhão de farinha
pra fazer o meu pirão!

quarta-feira, janeiro 18, 2006

Em cartaz na biosfera

Profissionais ordinários,
amadores mais baldios
que românticos,
pontas de fio a pavio
neurastênicos e afônicos,
tradicionais atores
dos espetáculos cênicos
em cartaz na biosfera
com irônicos cenários
e cânticos fuleiros,
obras e manobras
de matreiros senhores,
cobras que fazem de conta
que tudo isso não é à vera!;
mas,
apesar da monta dos obstáculos
e da xepa chinfrim,
há algo de bom na temporada,
o dia tá quente
mas passa um fresco
de quando em quando
bem rente a mim,
o refresco de cevada tá gelado,
bem cotado o da caninha
pois é de boa cepa,
e uma mutreta à-toa na folhinha
faz chegar o Carnaval,
a maior festa do planeta,
e a gente se posta
e faz piquinique
lá na bosta da geral
e vê tudo por uma fresta!

Surfei às pampas na onda média

Segundo o Sigmundo,
que não dispensa monólogo,
não é astrólogo mas dialoga com astros
toda vez que pensa,
estava uma droga
o pendão no mastro
pois a posição era indevida,
logo,
havia rastro e indício
de um estádio não propício,
mas,
como não me castro
com a comédia da vida
porque tenho cancha
e já era noite,
e sob a toga da noite
a ronda não me nota,
soltei as rédeas da prancha,
e, com garra pela rota,
surfei às pampas na onda média
de uma rádio de Sampa
que patrocinava a maior farra!,
então,
já lá pelas tantas,
que a gente se dana e morre
se do coração não bane
tanta inane emoção
tomando um puta porre,
fui à luta e furei o Lourival
que estendia no quintal
a bandeira do Palmeiras,
maior rival do meu Timão,
foi o maior banzé!,
como não houve jeito
de escapar da barafunda
pulando o muro,
ficou a onda média
plana e ridícula pra mim,
e fui surfar em cana,
e ele foi pegar jacaré
em leito do hospital
que o furo foi na bunda,
e tudo findou assim:
FIM!;
qual película da Cinédia!

sexta-feira, janeiro 13, 2006

“Cada um com o seu cada um”

Não sou raposa,
menos ainda raposa felpuda
porque sou calvo,
nem sou malandro,
sendo assim,
pra me manter são e salvo
e não virar alvo
de intriga e confusão,
não dispenso arruda,
não xereteio briga e meandro,
não dou opinião
em problema alheio
e penso sempre no meu lema:
“cada um com o seu cada um”;
por esse motivo,
não devo nada
a marido nenhum!,
que esposa considero macho
e com macho não quero cacho,
não vivo dividido
entre Sofia, Joana,
Teca e Josefina
porque divido bem
cuecas, vinténs
e os dias da semana,
pra mim,
não é questão
o "ser ou não ser?!"...
que este tema
lá na esquina não tem vez,
me dou legal com o Fisco
porque belisco por mês
um salário mirim
que quase não noto,
imagina então o fiscal?!,
meu voto é branco ou nulo
que não me regulo
por papo de eleição,
quando engulo sapo,
não banco o valentão,
e amizade já faço
achando que o sujeito
é o craque da falsidade,
um amigo-urso
que quer me dar um baque
com abraço de tamanduá,
desse jeito,
tomo o cuidado devido
e evito decepção,
e assim levo a vida na flauta,
vou indo e vindo
com a guarida da Constituição,
mas,
uma chateação
não sai da pauta,
meu combalido time,
quase falido,
meu time querido
me deixa aflito,
deprime e consterna,
faz campanha ruim,
campanha chinfrim,
campanha pingüim,
fria em cima de fria,
quando acredito
que é a hora da virada,
a coisa piora!,
apanha, leva surra, goleada,
o adversário lava a burra
e aqui esse otário
agüenta a gozação no botequim,
por fim,
ele apanha um pouco mais,
vai lá pra trás
e hiberna na lanterna!

quinta-feira, janeiro 12, 2006

Não mais no um cinco cinco só!

Foi precursor da percussão
ocorrida durante o percurso
em dia de expediente
no calor da Avenida Rio Branco
e que não podia
ser tachada de acidente,
pois,
consciente recurso
o tranco no teso por definição
e indefeso pedestre
bem diante do banco,
o otário desviava a atenção,
aí,
o meliante se valia da forquilha
e lhe batia a carteira
com o salário parco,
e chegou a se gabar
de ser um marco,
mestre em pilha
e titular da cadeira
no curso de pós-graduação
da Faculdade de Gatunice,
o que enchia de vaidade
sua cara-metade
que dizia ter sido
Miss Roubalheira
na mocidade,
agora,
resmunga que é hora
da decadência da punga
face à concorrência desleal
da tunga oficial
e não arruma aposentadoria
pela Previdência Social!,
em suma,
como já ultrapassou
o limite de idade
pra fazer concurso
e vai levando a família
um dia-a-dia de dar dó
e nó na barriga,
não recusa convite
de amigas ou amigos
pra fazer sociedade escusa,
e já está incurso numa quadrilha,
quer dizer,
num bando de artigos,
não mais no um cinco cinco só!

Você é...

Você é um sabiá cantador
e decanta asas pra voar,
sabiá que sabe sabe
o sabor desse canto cantado
pelo prazer de cantar
um canto ainda mais encantador;
você é um mainá falador
se não dá vaza a seu cantar,
mainá que sabe sabe
o sabor de ser um ser solto
em seu cantar encantado,
envolto em canto que sabe a amor;
você é um pitauá, urbano
e dono de um canto afinado,
pitauá que sabe sabe
o sabor e a emoção do canto
cantado com o coração
pois sua razão de ser é ser cantor;
você é uma ave que entoa
seu canto e com ele voa
pois seu canto é nave,
chave que o peito abre de um jeito
que nada mais tem sabor
tanto quanto o seu canto tanto tem!

terça-feira, janeiro 10, 2006

Cheire de verdade essa flor

Cheire de verdade essa flor
em vez de se exculpar
dizendo a todo momento
que não é flor que se cheire
porque é de brotar
em acostamento de estrada,
porque é de medrar
em barro, vasa, água parada,
cheire essa flor
e a imagine sem praga
em jarro que enfeita
uma casa afeita ao amor,
cheire essa flor
como se não fosse
uma flor à venda
na vitrine do prazer,
tente ver as prendas
que na alma ela cultiva,
tente ver a nativa graça
que não se abala
com trauma e cinismo,
faça por onde
notar o poder do lume
que seu otimismo aviva
mesmo quando o mar
não está pra peixe,
tente inalar
o perfume amador
que se esconde
sob o odor do ofício
que com artifício ela exala,
sinta como é delicada essa flor
desavergonhada por necessidade,
e sem vaidade,
sem preconceito,
deixe que essa flor
tenha o direito
de ser flor de verdade
ao florescer no seu peito!

segunda-feira, janeiro 09, 2006

Por entre fragmentos de fim de tarde

Por entre fragmentos
de fim de tarde
que a calçada tragava,
se aproximou de mim
a vendedora de amor
que enfeitava o momento
como se fosse uma flor
doce e sedutora,
e chamada felicidade,
aí,
me enchi de vaidade
e abri meus braços
com destemor e fiz alarde,
fiz o alarde que faz
quem não presta atenção
em mais nada,
exibi o sorriso
que sorria aos domingos,
fiz de improviso passos
que eram pingos de festa
e que só faz
quem rodopia com vontade,
desprezei aviso e conselho
e fui incapaz de ver
o que o espelho me dizia,
não vi que ela fazia
o queria de mim
e que só me queria
que podia fazer assim,
e ela fez o que quis
e, por um triz,
não me fez chegar ao fim!

sábado, janeiro 07, 2006

Não levaria essa vida de merda!

O que é que você
da vida tá pensando,
doutor,
empinando esse nariz
por controle remoto?!,
sei que ninguém mais diz
que vai tirar foto
em lambe-lambe,
que vai botar elepê na vitrola,
que vai manuscrever bilhetes
e remeter por via dos Correios,
pois,
hoje em dia,
a tônica é a eletrônica
embutida em tudo,
de sapatos e arreios
a robôs e foguetes,
de violas e agogôs
a criados-mudos
e panos de prato,
ou, então,
engenharia genética,
célula tronco,
coisa capaz de resolver
danos e avarias,
capaz de converter
ronco de dinossauro
em canoro assobio,
rapaz frio, bronco
e de tez pálida
em libélula plena
ou sirena cálida e poética,
contudo,
doutor,
se tivesse dado uma lida
nas letrinhas do contrato
e nas suas entrelinhas,
veria que o que vale de fato
segue com a mesma garantia,
em suma,
nenhuma!,
e não pensaria o que pensa,
não seria essa lesma
tensa e lerda,
não levaria essa vida de merda!

sexta-feira, janeiro 06, 2006

Acorde, rapaz

Acorde,
rapaz,
tire essa saia justa
e saia desse armário,
se vire se for necessário,
mas,
ponha as mangas de fora,
faça alvoroço,
pinte e borde,
nem que seja à custa
de umas doses a mais,
pois o busílis é o seguinte:
a vida é à vera
e a hora não espera!;
com vergonha, canga e bílis,
na melhor das hipóteses,
você vira um poço
de gastrite, psicose,
neurose e dor de cabeça,
vamos lá,
não seja só ouvinte,
dê uma de orador também,
palpite, discorde,
dê a opinião que você tem,
em que pese
o que pode estar em jogo,
não evite bola dividida
pois rola com ela
muita emoção,
não despreze aventura
nem fogo de paixão,
e não esqueça,
quem não procura
não acha,
quem não se encaixa
fica de fora,
não sente o sabor da parte
quem faz questão
de ter tudo por inteiro,
quem deplora
uma pitada de loucura
vive uma vida de nada,
uma vida sem a arte do tempero!

Barraca do Moa (Pendurado na palavra)

Saí de lá um farrapo,
frangalho indecente
pendurado na palavra
por um fiapo,
e esse fiapo
quebrava meu galho
literalmente!,
aliás,
uma palavra à-toa
jogava mais
que canoa em alto-mar,
fazer frase?!,
nem pensar!,
em outras palavras,
saí de lá
praticamente
sem sair do lugar,
até um verso chinfrim
versou contra mim
e me pegou pelo pé,
e nem sei eu
se pelo dele ou se pelo meu!,
também...
veja você,
como um calça-curta
incapaz de fraude,
que jamais se furta
ao mando da patroa,
fazia feira na Garibaldi
de saca na mão
quando bati de frente
com a barraca do Moa
botando gente pelo ladrão,
e gente boa-praça,
gente ilustre,
e cachaça, cerveja
e só quitute bom!,
aí,
dei um chute no balde,
ou seja,
mandei plantar batata a dita-cuja
e, de lambuja,
agrião, tomate,
abacate e pimentão,
entretanto,
a hora voa nessa hora,
quando dei o fora,
já estava escuro
e eu pronto
pra depenar o Zorro
e desmascarar o Tonto,
e até hoje tô tomando
esporro da patroa
por causa desse furo!,
mas não faz mal não,
o pau ela pode quebrar,
pode quebrar até o meu!,
mas eu juro,
e não é jura à-toa,
vou voltar
à barraca do Moa,
e vou nem que seja de maca!

Esse caminhante

Esse caminhante
do arco-da-velha
não dá ponto sem nó,
até duende
prende em flagrante
pra virar o caminhante mor!,
mas tem só botas chulés
e um parco par
de barro como seus pés,
na cozinha,
conta anedotas,
bebe pinga e groselha,
impreca e xinga,
come sardinha frita,
pita um cigarro fedorento
e tira um sarro
no assento da Amélia
que é levada da breca,
na sala,
da água pro vinho
muda a figura,
arrota camarão
e nem o molho esquece!,
conta lorotas,
exala pura emoção
quando fala em caminho,
aventura e caminhada,
esse caminhante
adota a bandeira
que está mais à mão,
a primeira que aparece,
desce a escada,
passa pelo portão,
pega a estrada de olho fechado
pra olhar pro lado
e não ver o que acontece!

quarta-feira, janeiro 04, 2006

Sou moleque de rua

Sou moleque de rua,
sou de pegar no tranco
e de sentar a pua
ladeira abaixo
sem pisar no breque
pra levar
o que você acha bom,
branco, marrom,
sou moleque de lero-lero,
besteira e gíria,
na hora da dura,
na hora do esculacho,
sofismo,
apesar de não saber
o que quer dizer,
e dou show de cinismo,
é minha armadura,
e vou esperando que Odin
mande Valquíria
vir atrás de mim,
e vou esperando vir a bala,
a vala comum,
por fim,
o Valhala,
se é que vou ter um!,
e vou assim,
berro com o ferro na mão,
uso gazua,
mixa chinfrim
que abre fechadura
mas não me abre porta
nem a comporta
que suporta
minhas chagas e mágoas,
as feridas
que fizeram sua plaina,
sua lixa e seu formão,
mas não desentortaram
minha vida torta,
não alinharam
minha faina retorcida,
é isso aí...
da ralé sou o lixo,
sou o bicho no seu pé
que lhe tira calma e sossego,
sou um nego
que não lhe importa
e que você despreza,
alma
que está na sua mira,
que você reza pra ver morta!