sexta-feira, fevereiro 25, 2011

E que Iemanjá te proteja!

Não tema,
respeite o mar
e espreite a remada
de quem já rema bem,
se solta e sai,
vai e à enseada
seu escaler traz de volta,
espreite, aprenda a remar
e seja um bom marinheiro
e até ousado
se o mar lhe disser
que é hora de ousar,
agora,
sempre atento
aos pontos cardeais,
calados, faróis,
contos de faroleiro,
seja atento o bastante
pra não se perder
diante do inesperado,
saiba ler o céu,
se valer das marés,
desatar
os nós do vento
e se livrar da corrente,
saiba ver através
do véu intransigente
da mais feia madrugada,
e não se deixe levar por nada,
nem por pranto
ou canto de sereia,
e aprenda a pescar
e a vender seu peixe,
mas,
jamais se venda,
vamos lá,
um bom marinheiro seja
e vá sem medo
e sem se afobar
porque é cedo
e, dia após dia,
mais um segredo
vai te contar o mar,
e que Iemanjá te proteja!

quarta-feira, fevereiro 23, 2011

Já vou indo

Já vou indo
pra não passar da hora,
por favor,
pague
a conta do boteco
que, no momento,
estou desprevenido,
e vou beber a saideira
que não poderia ir a seco,
não esqueça
a sardinha do Folgado
nem de regar a Etelvina,
mas,
não a encharque,
ela é muito frágil,
e ponha adubo
uma vez por semana,
como de hábito,
deixei no banheiro
toda enrolada
a toalha de banho,
e molhei o chão,
e usei o vaso
sem levantar a tábua,
não queria por nada
que parecesse a ida
confissão seguida de fuga,
esqueci sobre a cômoda
o seu retrato,
o que levava na carteira,
rasgue-o se quiser,
não deixei
meu novo endereço
que é melhor
você nem saber
onde vou morar.
Um abraço e um beijo.

P.S. Risquei o beijo
que o achei inoportuno!

segunda-feira, fevereiro 21, 2011

Tenho dezoito só!

Não me venha
com essa besteira
de “cresça e apareça,
dê tempo ao tempo,
quem avisa amigo é”;
não precisa me avisar,
quero jogar o jogo,
botar lenha na fogueira
e o fogo toco se precisar,
e quero mais, muito mais,
meu amigo,
quero meu bloco,
minha passeata
e encarar tapa e bofetão
com faixa, brado e cartaz,
cabeça baixa
não é comigo não,
quero ir à cata do amor
e, tal qual camelô,
oferecer paixão
plantado no meio
da avenida da vida
sem ter receio do rapa,
e ser o pivô da disparada,
quero ser
o melhor amante,
e com meu suor
cobrir a minha amada,
quero ser
comandante do meu barco
e navegar e no mar
ser um marco importante,
por favor,
tenha dó,
não me venha com essa,
não me peça
pra não ser afoito,
tenho dezoito só!

sábado, fevereiro 19, 2011

Beijo vazio (The End)

Beijo vazio
é um beijo aflito
e cheio de pressa
e faz o peito sofrer
de um jeito esquisito,
e que aliviação quando cessa!,
e seu gosto ruim
o fim da paixão prenuncia,
ainda assim,
de quando em quando,
nos impele e seduz
e o desejo aflora
e a pele insiste,
todavia,
é um desejo seco,
tão seco
que nos esfola
e faz gemer gemido
que denuncia o fastio,
e o desejo é premido
e rola pra fora
feito pus de ferida,
e o coração
não resiste e chora,
e, um dia,
“The End”,
e se acende a luz!

quinta-feira, fevereiro 17, 2011

Na clave de cifrão

Hoje em dia,
a maioria do samba
que a gente ouve
de samba não tem nada,
não é, de fato,
prato da nossa culinária,
o paladar é de amargar ,
dá pra imaginar
feijoada sem nosso tempero?!,
sem couve, sem paio, sem chouriço?!,
sem isso,
a harmonia cediça enjoa,
a poesia não é boa
e dá urticária no idioma,
e o raio do troço enche linguiça,
por essa razão,
o samba verdadeiro vai se aposentando
e o bamba vai mal
e quase entrando em coma,
é... é grave a situação
que o que mais por aí a gente ouve
é um troço
que nosso jeito não tem não,
troço feito na tal clave de cifrão!

terça-feira, fevereiro 15, 2011

Velha-Guarda (Ponha-se no seu lugar!)

Quem você pensa que é?,
rapaz,
nem contou até dez
antes de entrar!,
aliás,
entrou
sem pedir licença
e fazendo escarcéu,
não pediu bença a ninguém,
nem ao menos
com o chapéu fez um aceno!,
ponha-se no seu lugar,
rapaz,
um dia,
talvez você volte,
mas,
vai voltar
com ferida nos pés,
o regalo da estrada,
e com calo na mão
que a vida
é plantada e colhida,
é enxada e é ancinho,
vai voltar com a alma
encharcada de sereno
e trazendo
alegrias e dissabores
deixados pelos amores
encontrados pelo caminho,
e vai voltar com calma,
vai parar
diante da porta aberta,
com o panamá branco
vai fazer um pequeno aceno
e, na certa,
a Velha-Guarda lhe dirá:
“pode entrar!”,
mas,
até lá,
sendo muito franco,
ponha-se no seu lugar!

segunda-feira, fevereiro 14, 2011

Verão no asfalto

O verão aquece o asfalto
que ferve que só
meu galipão fervia
e não tem dó
do pezinho da morena,
e a morena
pra mim é uma uva,
e que se conserve assim!,

todavia,
uva é fruta
passada e pequena,
hoje em dia,
graças ao progresso,
a fruta é maior,
aliás, bem maior!,
e o ponteiro gira
e a danada
não mais vira passa,
o progresso é maneiro...
agora,
causa confusão,
é!!!, tenho certeza que é!!!,
não!!!, tenho certeza que não!!!,
é ou não é?!?!?!,
causa ou não causa?!,
bem,
pelo sim, pelo não,
pausa pra meditação!,

e o asfalto
amolece o salto alto,
e a morena
solta gritinho erótico,
faz beicinho e chora
chorinho hipnótico,
chora à la “Brasileirinho”,

sai milênio, entra milênio
e o chorinho não passa!,

e abunda a ajuda
frenética, eclética,
ou melhor, sincrética,
bossa bem nossa!,
e inunda a praça
um cheiro intenso
de incenso, arruda e suor,

mas,
tem gente que alega porre
e se apega
à ação diurética da cervejota,
lorota!,
a bem da verdade,
essa gente
mija por aí em bloco
porque tem o tico
de fazer de penico a cidade,
e um Rio de urina corre
e o Rio se afunda na fedentina,

vá mijar no banheiro!, mijão!,

bem,
o foco é a morena
e a morena é uma só,
e tem tribo bradando:
“farinha pouca,
meu pirão primeiro,
e a ética que se funda!”,
e tem bando passando recibo,
e essa rinha é muito louca,

e tem a vasa
que não poupa a infância
que na esquina tá dando sopa
porque não tem casa,
ou porque não tem escola,
ou porque na sala não há professor,
e lá se vai a infância pela latrina...

e um cínico,
de branco à la doutor,
não dá bola
pra tranco e bafafá,
entra em cena
e examina e embala
o tornozelo da morena,
mas,
ao vê-lo com olho clínico,
um profissional aventa indício
de exercício ilegal da medicina,
e chama a polícia,
e com a notícia a chama aumenta,
porém,
se de cínico merece a pecha,
de babaca
o cara não tem nada
e nem se abala
que saca cada brecha do sistema,
poxa!, como o sistema tem brecha!,
e o cara
a panturrilha escala
e já fala em coxa e virilha,

e um patife
da Baixada ou de Ipanema,
um machucho barrigudinho
trajando terno de grife
que freou o veículo de luxo
e apeou do celular ultramoderno
e que pode até
ser cafona e ridículo,
mas que de trouxa não tem nada,
pra ganhar espaço na zona,
dá de exaltar
o que, por aqui,
é o mapa da mina,
padrinho e pedigree,
e tem meia, cueca e mala cheia de grana,
e se dana muita gente que rala,
e não escapa
nem gente fina com bom currículo...

e você,
boneca,
tem calcinha e sutiã,
é... sutiã...
sustenta-seios, porta-seios, califom, estrofião, corpete, corpinho...
aliás,
nessa ocasião, você sabe,
o macete é usar
um sutiã bem larguinho
e uma baita calcinha
porque cabe muito mais gaita!,

aí,
um exemplar
de uma espécie
a um passo da extinção,
e em preservação não ouço falar!,
bem,
um moço cavalheiro
oferece o lenço e o braço,
mas,
à espécie o solo é infenso
e o cavalheirismo não floresce,
e ainda cismo e me amolo com isso...

e tem sapateiro
na cola do calcanhar
e não do sapato da moça,
e o desvio de função é claro,
e tem gangue
achando um barato
andar no calcanhar da cola
e uma poça de sangue no olhar do guri,
e, é claro, mais uma geração no desvio,
e daí?!
se isso ninguém vê...

e vem gelo daqui e dali
voando na gravata-borboleta
e preta que, veja você,
não reclama do atropelo
nem da cliente
exigente pra chuchu:
“põe aqui!”, põe ali!”,
“tira!, tira!, tá doendo!”,
e a gravata-borboleta
esvoaçando e desfazendo o nó,

só não vem a Brahma que eu pedi!,
aí, Zeca, dá pra dar uma ajudinha?!,

e tem Julieta
se metendo no alvoroço,
falando grosso pra cacete,
estendendo tapete vermelho
e a gatinha afagando por extenso,
é munheca no joelho, no artelho, no...
bem,
deixa pra lá...
é... Romeu,
penso eu que você...

e há ambulante
em plena atividade
e a todo instante
dando no berro
seu recado à morena,
o que não é novidade pra ninguém,
e um segurança privado,
cartucheira vazia
que é dia de folga,
se empolga e afiança
que pra sacar ainda tem um ferro,

e, pra ver
o que por aqui
ainda ninguém viu,
e deve ser muito linda!,
tem contorcionista
plantando bananeira
e o corpanzil
virando pelo avesso
apesar da espinhela caída,
e tem cambista
achando que a saída
é rasgar a tabela
e pagar qualquer preço
pra recomprar de turista
um bom lugar no gargarejo,

e tem menestrel de bordel
aproveitando o ensejo
e fazendo chorar
machão
de emoção filial
e madame de saudade,
e não é vexame não,
afinal,
mãe é mãe
e mocidade é mocidade,

aliás,
você que se faz
de palmatória do mundo,
é bom você saber,
segundo seu Zé do Nabo,
que não tem
o vezo de cantar vitória
nem o rabo preso com ninguém,
sua genitora,
quer dizer,
a leitora o enganou
quando leu a sua mão,
e, se seu Zé do Nabo falou,
tá falado!, entendeu o recado?!,

e tem otário inato
apostando
tudo que tem
num trato revolucionário,
estimulação imunológica
com a inoculação,
no tronco da sua árvore,
de células-tronco
da árvore genealógica
de um vigarista hereditário,
e o doador promete
terapia sem dor
e total assepsia
que a introdução é virtual
e as células vêm via Internet,

e tenta iludir a morena
um pacifista
cansado de guerra
que não se manca,
tenta cobrir a pomba
com bandeira branca
que já não se aguenta,
e se ferra
e depauperado ele tomba
que a trincheira é um colosso!,

e tem operário aflito
ao pensar no pito do patrão,
porém,
alegando a mais-valia
e esticando a hora do almoço
pra tentar a sorte
com vale-transporte e tíquete-refeição,
o que mais o salário-mínimo tem?!, o mínimo?!,

e tem até senhora,
titia cansada de consolação,
entrando na dança,
queimando o pé no rolo
e levantando a saia
na esperança
de virar fatia do bolo,
e levando uma vaia danada!,

e na pista
tem um misto
de Narciso e Adônis,
short, camiseta,
silicone embutido,
fones de ouvido
e sorriso de ninfeta,
e, pelo visto,
a torcida tá dividida
que tá dando na vista
tanto quanto a morena,

e um rapagão
visivelmente avantajado
sem acanhamento mete a cara,
apela e não para
de falar em mandar brasa,
e a morena se derrete
e seu assanho extravasa de uma vez,

e vocês ainda creem
que tamanho não é documento...

e o papel do fogaréu
no processo de ebulição,
na frente do pai,
é detalhado
por um pivete
que saca paca do assunto
porque vê novela na tevê,
e seu entusiasmo faz sucesso
e o povão vai junto ao orgasmo!

quinta-feira, fevereiro 10, 2011

...

Desbota mais uma foto,
e mais uma desbota,
e mais uma,
e me esgoto tentando lembrar,
e lembrar tento tanto,
e tento,
e noto o pranto
e já não tanto tento,
e já não tento tanto,
e já nem tanto pranto,
e já nem noto a foto,
desboto e já nem noto...

quarta-feira, fevereiro 09, 2011

Alguém me rogou essa praga

Ela pisa nos meus calos no café,
repisa no almoço e no jantar volta a pisar,
aproveita os intervalos
e me enjeita, rejeita e pega no meu pé,
mas,
pegar pra ela não basta,
ela pega e não solta
e me arrasta pro fundo do poço,
e quanto mais me afundo,
melhor,
e o pior é que ela
não me alivia nem em dia santo,
e tem mais,
o prato predileto dela
é projeto meu que malogra
e ela festeja quando eu pago o pato,
mas,
quando algum
logra algum sucesso,
ela se vinga
dando vazão ao acesso de gana
e me xinga e excomunga,
e a sogra comunga
com xingadela e excomunhão,
e a dobradinha
festeja de novo
quando meu time se dana,
e festeja
malogro da minha escola
e cobrador na minha cola,
e festeja com furor
quando o sogro canalha,
a rolha do poço
no qual ela me mete,
mete o pau em mim e a mão
no meu panamá novo em folha,
enfim,
moço,
se me achincalha e deprime,
a dobradinha festeja,
ou melhor, o terceto,
melhor ainda, o quarteto
que ela já me avisou
que na cama de casal
não há mais vaga
que o cunhado encostado
adorou colchão,
chinela e pijama de flanela,
e se viciou em ar condicionado,
e eu pago pelo vício do safado...
é... alguém bom no ofício me rogou essa praga!,
garçom, por favor, me traga mais um trago!