sexta-feira, fevereiro 24, 2006

São os ventos

Me tenta ventania,
cascalhada, pé-de-vento,
me atenta e enfrento,
e a danada vira tufão,
de jeito me pega,
arrebenta o leme,
e treme e teme o timão,
e a danada me carrega,
sem rumo nem prumo,
a vela vai ao limite,
cansaço, exaustão,
então,
quando a vela
já não mais agüenta,
recalmão se apresenta
e dá esperança de bonança,
e aceito o convite
pensando em aragem,
bafagem, viração,
e caio em seu braços,
todavia,
vem calma, calmaria
nenhum vento
e sem vento não há salvação,
não é solução
essa vela inerte e fria
que me subverte,
verte falta de emoção,
e a falta não agüento,
e com o coração
agitação a alma ensaia,
é cochicho daqui e dali,
e o cochicho não falha,
se espalha o bicho
pelo corpo inteiro
que a razão
não está de atalaia,
e saio por aí
a buscar carpinteiro, pampeiro,
carpinteiro-da-praia,
mas,
sou assim,
useiro e vezeiro
em pegar mó de vento,
em me aventurar pela fantasia,
me visto de faraó
e insisto em buscar
o alento do cansim
pra desfraldar minha vela,
como já fui até lá,
levado pelo o afefé,
por sua magia,
mãe Iansã,
tento velejar
em harmatã, simum,
os áfricos,
tento um a um,
entretanto,
vem saudade num áfrico
e venta na vela,
e saudade
me faz dar guinada,
trocar catamarã por jangada
e vou atrás de aracati,
marajó, mossoró,
mas,
o vento se reinventa,
inventa repiquete
e repiquete salta e ronda,
e uma onda me assalta,
inverte a direção,
a cada momento
mais desorientação,
mais se desorienta a vela,
mais me desoriento,
fico sem saber
o que fazer
pra ir adiante,
são os ventos
que põem defronte de mim
só o horizonte,
aberto, deserto, sem fim,
igualmente distante
por mais que tente
chegar mais perto,
horizonte...
sempre igualmente distante!

Canto e não paro de cantar

Canto
e não paro de cantar
porque sou canção ao vento,
cem por cento peito aberto,
canto
e não paro de cantar
porque sou canção ao vento,
cem por cento peito aberto;
canto
porque estou sujeito
ao amor que coloco
em cada passo,
sou feito
de compasso e harmonia,
sou a alegria de acordar
a cada acorde que faço,
sou a magia
de ser tocado
a cada nota que toco;
canto
porque sou todo música,
mestra música,
música de orquestra,
banda e bateria,
de bloco que anda
e arrasta multidão,
de solista que inebria
e de artista da folia,
folião
que repete
e repete
e repete
e quase desgasta o refrão;
canto
e não paro de cantar
porque sou canção ao vento,
cem por cento peito aberto,
canto
e não paro de cantar
porque sou canção ao vento,
cem por cento peito aberto.

quinta-feira, fevereiro 23, 2006

Madeira de dar em doido

Sei bem
que é nó na madeira,
e em madeira de lei,
e madeira
de dar em doido
que doido é também,
doido de pedra,
doido
de jogar pedra em santo,
doido de causar espanto
em doido varrido
que varre a doideira
como se varre
pro canto a sujeira,
é doido curtido,
tão ou mais doido
que qualquer doido
com carteira e certidão,
é doido metido
e com tradição
que a doideira
é bem de família
e já tem até filha
que brilha na malucação,
e tem fama
de ser doido de cama e mesa,
doido beleza
que vê tudo azul
quando ouve o Raul,
ele é doido, doido,
doidão por inteiro,
mas,
não rasga dinheiro não!

quarta-feira, fevereiro 22, 2006

"Tropicalice"

Pra onde vai me levar
essa tropicalice
que me faz
pensar com os poros,
aí me arvoro
em senhor da verdade
e me assenhoro
sem rubor de qualquer tolice;
pra onde vai me levar
essa tropicalice
que me faz
nadar contra os ponteiros,
ser pioneiro ao contrário
e, quando escolho,
dizer que tem prioridade
porque se disse ser prioritário;
pra onde vai me levar
essa tropicalice
que me faz
votar pra presidente
de olho, em essência, no vice,
ou vice-versa,
me faz ir em conversa
que só na aparência é diferente;
pra onde vai me levar
essa cadeia de tropicalice
que me faz ter dó
tão-só da tropicalice alheia!

terça-feira, fevereiro 21, 2006

Nem maciço nem de pau oco

Nem maciço nem de pau oco,
afinal,
não sou santo,
mas o meu me protege
ou minha santa,
mas,
também não sou herege,
isso eu garanto,
por outro lado,
não sou normal
nem cem por cento louco,
às vezes,
a folia é tanta,
é tanto o frege,
que me entedia e vira tormento,
cansado,
peço arrego,
chega!,
a alma elege a calma
lá do meu regaço,
braços e chamego da nega,
mas,
em outros momentos,
por mais que procure
e até faça o que posso
pra nem pensar,
o bicho pega
e não agüento de saudade da rua,
nessa hora,
o regaço vira clausura e me amargura,
meu pedaço me acua e asfixia,
e coço, comicho,
que me arrepia e devora
a vontade de cair na farra,
a essa altura,
já não há amarra que me segure
e corro atrás de liberdade,
de menina, torresmo e gasolina,
mesmo ciente
que ainda morro de porre e boemia,
mas,
que diferença faz
se toda a gente
morre mesmo um dia?!

Quero bis

Quero bis,
no quadro o giz,
e sem esquadro,
e sem compasso,
a descobrir a flor,
a sentir
passo a passo
como é doce seu sabor,
quero bis,
ser feliz
como a primeira flor
fez se sentir o aprendiz,
quero ouvir
a mensagem da flor
como se fosse
virgem meu ouvir,
quero sentir vertigem
à maneira de marinheiro
de primeira viagem,
quero sensação de estréia,
emoção e suor
de quem
não tem a menor idéia
de como o ato há de ser,
o ato primeiro,
quero bis...
quero bis
do primeiro e inteiro prazer!

Revelação

Vou bater foto
desse incrível amor
que boto pelo olhar,
mas,
invisível pra ela,
vou fotagrafar o ardor,
a emoção que sinto
e que se revela
na escuridão do recinto,
esse meu peito
que anda feito
câmara escura,
só a luz vermelha e branda,
quase envergonhada,
que se assemelha
a de antecâmara
de lupanar do interior,
vou me revelar
sem censura
até tornar visível
a paixão transparente,
até acabar
com a latente sensação
de que não passo
de emulsão impressionada,
vou revelar
cada traço
desse bem querer
que me faz ficar vivo,
que não quero mais
ser esse negativo
onde você
não é capaz de me ver!

segunda-feira, fevereiro 20, 2006

Não tem nada a ver com o vinho

A gente pisa, repisa
e reprisa a pisada,
mas,
não tem nada
a ver com o vinho
o suco carmim
que a dorna entorna,
e a gente
inspira e expira
um cheiro chinfrim
que não torna
o ambiente fragrante,
que não é de pinho
nem de sândalo,
é do muco fedido,
suor de quem
não tem desodorante,
quando a gente
tem roupa,
não é abundante
nem nos adorna,
pois não é linho
ou outro tecido maneiro,
é do que há de pior,
e a gente não poupa
que, além de escândalo,
o dinheiro é humilhação,
seja aposentadoria,
jorna ou pensão,
agora,
quando a gente
chega em casa,
é a hora
que mais nos arrasa,
é a ducha mais fria,
embora não haja água,
quanto mais
água quente ou morna,
e a gente murcha,
e de barriga vazia
no chão a gente encorna!

Santo de bar

Santo de bar,
ninguém sabe
qual é o seu altar
nem em que religião
seu culto cabe,
ou,
se na verdade,
é só mais um vulto ufano,
machão e paradoxal,
mais um Fulano
que não abaixa o facho,
por cima,
uma identidade,
outra por baixo do pano,
como é tão comum
nesse nó nacional
em clima de verão tropical
com Carnaval
e festival de bumbum,
santo de bar,
ninguém sabe
se faz algum milagre,
se é um mago
que se abre
com o afago do devoto
e ensina o truque
pra acertar
as centenas da quina,
todas as seis,
e pra ganhar no bicho
com duque de dezena,
uma da hiena,
uma do bagre
e uma da pedrês,
mas,
noto que santo de bar
leva um trago
de cada dose de xinabre
que bebe o devoto,
um lauto, outro mixo,
mas leva,
e nunca vi santo de bar
ficar alto e fazer tititi,
santo de bar
é mesmo bacana,
nem tem time pessoal,
torce pelo do beberrão,
não reprime
nenhum dos três sexos,
não fica perplexo
com cada tom das epidermes
nem com o local da devoção,
serve qualquer um por aí...
tanto faz Marechal Hermes,
Copacabana, Baixada ou Leblon,
mas,
nunca ouvi
alguém chamar
santo de bar pelo nome,
mesmo que o devoto
tome bem mais de uma,
e ninguém tem sua imagem,
em suma,
posso afirmar
de maneira enfática,
santo de bar
não é miragerm
nem besteira não,
e, se ele não se chatear
com a força de expressão,
posso assegurar
que sua glândula hepática
é uma glândula
que não é mole,
pois agüenta um gole
de doses e mais doses
de água-benta
e nem com cirrose esquenta!

sábado, fevereiro 18, 2006

Azua

Azua,
saia de cambraia,
tomara-que-caia,
raras alfaias
que não valem
nem um vintém
e sem aias de atalaia,
Azua,
ginga a esmo,
se blefaia pinga,
mesmo parca,
algum bem parco,
embarca no barco
de marambaia
de marca maior
e cai na gandaia,
se desnuda
e banca a cobaia
na teia
do que há de pior
na arraia-miúda,
quando se aquece,
quando se abraseia
a poder de cumulaia,
de pinga da pior espécie,
se empolga,
finge ser prosa
porque biraia formosa
inda é,
ou, então,
folga, bate o pé,
vaia, briga, xinga,
faz intriga à laia de catraia,
de biscaia
que não tem
a menor classe,
mas,
e parece até
passe de mágica,
muda de súbito
e põe à mostra
sua veia autofágica,
mostra quanto é infeliz,
e se prostra
chorosa e trágica,
maldiz o concúbito,
se penitencia e pede perdão,
Azua,
cria da zona,
dona e serva da rua,
vadia de pai e mãe
sem lar nem guarida,
se ninguém mais vai,
vou eu implorar
a proteção de Oçãe,
e erva capaz
de tirar você dessa vida!

Eu acredito em tudo

Minha crença é imensa,
eu acredito em tudo,
por mais esquisito
que pareça,
acredito
em sombração, fantasma,
bicho-papão, boitatá,
Papai Noel e abracadabra,
acredito
em chapéu
pra ocultar fuá
de cabeça de alfinete,
em colete salva-vidas
feito sob medida
pra tronco de jequitibá,
em licença médica
pra criado-mudo
se livrar do ronco
e das crises de asma,
em bota ortopédica
que cura de imediato
pé-chato de pé-de-cabra
bem como de pé-de-vento,
em tratamento
de varizes de perna de mesa
com meia elástica,
acredito
moderna tipóia
pra braço quebrado de sofá,
em cirurgia plástica
que em cara-de-pau
um jeito dá,
em anel de grau
pra anular de mão-inglesa,
em colírio
que é uma beleza
pra olho de furacão,
acredito piamente
que tem paranóia
essa gente que fala
em trapaça e tramóia,
gato, rato e cabala,
e vou ao delírio
com promissão de candidato
à cata de cédula
em véspera de eleição!,
por essa razão,
tenho pena
dessa gentinha incrédula
que apequena
minha imensa crença!

quinta-feira, fevereiro 16, 2006

"Tibambã bambandá"

Tibã tibambô,
tibambã bambandá,
tidâ tidandô,
tidandã dandambá,
saravá,
mãe Iansã, pai Xangô,
saravá,
quem vem,
saravá,
quem inda não veio
mas um dia virá,
tibã tibambô,
tibambã bambandá,
tidã tidandô,
tidandã dandambá,
saravá,
mãe Iansã, pai Xangô,
saravá,
quem vem,
saravá,
quem inda não veio
mas um dia virá,
saravá,
Dadá,
irmã de Luanda,
e de Ruanda
dinda Didá,
curingas do lundu e da ciranda,
saravá,
Dudá,
da Banda de Du
a mais linda,
e ainda nos brinda
com sua ginga,
saravá,
Dedé,
bubu e abadá
de holanda tranchã,
saravá,
Dandi,
beni folgazã
que manda no pé,
saravá,
umbundu de fé,
Dandã,
guirlanda e regô
como não há iguais,
saravá,
pais de aluanda,
meus Orixás,
mãe Iansã, pai Xangô!

quarta-feira, fevereiro 15, 2006

Até virar bola da vez

Sem parente e sem escola,
se mete esse pivete
em cada enrascada...
inventa cada moda...
roda com o movimento
até virar bola da vez,
cavuca daqui e dali,
descola mutuca e brizola,
arremete contra o vento,
decola e voa contra corrente,
vai em frente
pra atender um freguês,
esse pivete
vira ventania,
venta fogo pelas ventas
e arrepia a vizinhança
quando avança
e enfrenta o jogo
com os talentos que tem,
e nem tem tantos,
quando dança,
esse pivete
muda de figura,
mente por completo,
faz cena a mil
e é quase perfeito,
descerra um santo,
encena um pranto
e berra que nada fez,
e jura e promete
tanto quanto
consente o desafeto
que se encerra
em seu peito juvenil...
sem parente e sem escola,
sabe o pivete
que só há um jeito,
esperar
até virar bola da vez!

terça-feira, fevereiro 14, 2006

Logo eu...

Tomara,
apesar de ser
maior a chance
de ganhar na loteria,
tomara
que floresça o romance,
que você mereça
a cabeça que perdi
quando a vi
amadrinhando a bateria
da Bem-Te-Vi do Cafundó de Tribobó,
veja só como é irônico!,
logo eu...
orgulho de gêmeos
com calçada de sobra,
fêmeos subsídios à vontade,
lenda da malandragem
por toda a cidade,
cobra criada do barulho
e sem ofídios análogos,
agenda mais espessa
que catálogos,
e pode incluir o telefônico,
logo eu...
que nunca perdi a viagem,
nem em pelada,
nem em amistoso,
logo eu...
mais famoso na parada
que galã de telenovela,
logo eu...
que nunca precisei
ir ao itororó
no afã
de achar bela morena,
veja só...
logo eu
fui me enrabichar
por uma pequena
que é pequena
até de salto alto,
do lar não tem nada,
nem mesmo uma prenda,
é mais avançada
que cabeça-de-ponte,
dá asa a qualquer fã
e tem um monte,
e só de manhã volta pra casa,
logo eu...

segunda-feira, fevereiro 13, 2006

Baranga exclusiva

Volte,
minha Zunga,
Zunguinha da minha vida,
solte a franga,
tire a kanga,
se unte e bezunte
de creme de pitanga,
se encha de miçanga,
preencha com morango
esse umbigo e venha comigo
que estou nadando em mango
e, de saída,
vou pagar rango e ranga,
volte,
minha Zunga,
gueixa abençoada
pelo mananga da charanga,
quando você
fandanga e me espreme
com essa sua trunfa,
e geme e furunga,
e me funga e cafunga,
esqueço zanga
e nem ligo
se você me tunga,
me deixa de tanga,
sem sunga,
sem caranga
e leva toda a bufunfa,
volte minha Zunga,
minha Zunguinha,
e não precisa mudar nada,
tanto faz
se você é dada demais,
é capaz de ser
danada de efusiva
com a rapaziada,
eu não me importo!,
só não suporto mais
essa baranga de dar dó,
aliás,
baranga exclusiva!

sábado, fevereiro 11, 2006

Domingo maravilha!

Domingo maravilha,
maravilha de domingo!,
caio na preguiça
espreguiçada com cerveja,
e tem peleja na tevê,
arroz com ervilha,
lentilha com costela,
paio e lingüiça,
depois,
pavê de maçã
e pudim de baunilha,
por fim,
licor, café,
cigarrilha cubana
e o sabor da bela Dedé!,
filha da anfitriã,
que se abana e fervilha
indo e vindo,
pra lá e pra cá
sacudindo o balaio
e com os faróis de milha
tesos e acesos
naquela malha
que marca a virilha,
é isso aí,
coração!,
se espalha, chacoalha,
se enxarca de emoção!,
que não é todo dia não!,
é só no domingo,
domingo maravilha,
maravilha de domingo!

Que time é teu?!

Encontrei o Romeu
que logo perguntou:
“sabe quem sou seu?!”
e emendou:
“que time é teu?!”,
quase respondi:
“Andaraí...”,
mas ele não deixou:
“viu por aí o Biliu?!”,
“jacaré no seu...?!”,
“brinca com meu brinco?!”,
poxa,
até aí,
só dera o Romeu!,
mas,
me salvei
porque era segunda
e lembrei do Sunda
pra formar a trinca
com ele e Biliu,
mas,
era necessário
chegar aos cinco
pra ficar por cima
e não passar por trouxa,
e perguntei
pelo Mário e pelo Loxa,
é... meu amigo,
com antigo camarada,
pra não passar por mané,
é preciso fazer rima safada!

Jogador-quintessência

Caramba!,
dá uma gingada,
camba e descamba,
encena dar um pique de araque,
finge querer chegar ao ataque,
e sempre está
com a antena ligada,
que espera
que no horário certo
alguém lhe indique o empresário
escoltado pelo cartola de fraque
ao lado do destaque
da escola de samba,
e é preciso
ser esperto e arisco,
ter paciência
pra não ficar correndo
e correndo o risco
de levar tranco e baque,
tendo que brecar
e acabar pregado
no banco de reservas
e sem a renda da venda do passe,
e poupa suor parado,
observa melhor
o quique da esfera
e o desenlace do lance,
quiçá sua grande chance,
aí,
ameaça marcar mas não marca
que, de tão parca,
a vontade não pospera,
na verdade,
é bem marcado
e ameaça se desmarcar
mas não se desmarca,
mas recebe mesmo assim,
e cara a cara com o goleiro,
que o beque deu um cochilo,
por fim,
com muito estilo,
passa o pé pelo lado,
por baixo e por cima,
finge que vai mas não vai,
balança pra lá e pra cá
pra elevar a auto-estima,
dá pedalada
pra agitar a adrenalina
e está descerrada a cortina,
e penteia, saracuteia e rebola
como se tivesse bicho-carpinteiro
que isso faz bem à alma,
e, com calma,
esquece a bola e sai pela linha de fundo,
o mundo fica pasmo,
mas jornal e tevê
fazem a claque ver
que deve ir ao orgasmo
com o valor
dessa fenomenal jogada
desse jogador-quintessência
que garantiu as comissões,
os milhões da transferência,
e vai mais um craque pro exterior!

Não se chama Dom Pixote!

Mona Lisa, Mona Lisa,
agora entendi
esse sorriso de lince
que Da Vinci
sorriu em ti anos atrás,
te fez rechonchuda a sorrir
como irias sorrir aqui
onde muda, muda, muda,
mas acaba acabando em pizza;
e não dá pra parar por aí,
que esses italianos são demais,
com muita arte,
Bolognini,
Pasolini, Visentini e Mastroianni
fizeram um time
que levou à tela
novela de Brancati,
“O Belo Antônio”,
fraco, verde, amarelo,
useiro e vezeiro em dar pane,
incapaz de penetrar até
no buraco do ozônio,
e um estrangeiro,
que fez aqui grandes filmes,
de gozação,
me ofereceu uma Quilmes,
não é mole não!;
mas um espanhol
não me deixou botar um punto,
digo,
uma pedra no assunto,
Miguel de Cervantes Saavedra,
talento gigante,
criou Dom Quixote, Sancho Pança,
moinhos de vento,
e, sob nosso céu,
temos lá nossos moinhos:
Carnaval e futebol,
e a crise a gente mói,
quando não mói,
a crise a gente amansa
com bingo e domingo de sol,
outros moinhos do nosso elenco;
agora,
é bom que se frise,
nosso herói
na hora do rancho dança
e não se chama Dom Pixote!,
é só Pixote, o do Babenco!

Me acuda com alguma idéia

Por favor,
me acuda com alguma idéia,
preciso da sua ajuda
pra encontrar a panacéia
e me livrar desse rolo,
ela era azaléia,
bela e formosa a danada,
era avenca, delicada,
era rosa,
perfume
que me assanhava as entranhas,
e havia amor em penca,
amor-agarradinho,
e eu vivia louco de ciúme,
aí,
bem tolo e bem pouco sensato,
caí como um patinho,
paguei o pato
e colhi a flor
de papel passado e com padrinho,
e festejado com bolo e champanha,
depois,
lua-de-mel,
mas veio o mel na mala,
e veio feito bala, bombom, chocolate,
aí,
entrou aveia no copo de leite,
e bate um aqui,
bate outro ali,
bate mais um acolá,
junta cerveja com tira-gosto
nadando no azeite,
mete no bucho sempre disposto
feijoada e vatapá,
unta pão com manteiga e geléia,
e empuxo daqui, empuxo de lá,
e minha flor meiga e miúda
virou vitória-régia
capaz de causar inveja
à rainha-do-lago mais parruda,
um metro e cinqüenta
de altura, espessura e largura,
só vendo,
quando, toda faceira,
ela senta na banheira
e a água espuma e sai pelo ladrão,
eu levava a pluma nos braços,
agora,
só me desembaraço da função
usando um burro-sem-rabo,
tá complicado,
nosso quarto,
que já viu cenas de amor,
agora vive um drama
e nossa cama
seria arena de sumô
se eu também fosse farto,
a situação tá assim,
e rogo por uma solução,
que se essa encrenca
não acabar logo,
ela ainda despenca
e dá cabo de mim!

Pra quê?!

Pra que esse muro
com jeito de dique,
gradil na janela,
tramela e porta de ferro,
se a casa é de sopapo
e pau-a-pique
feito com pau-brasil,
e a casa não suporta
catiripapo, berro, dedo-duro
nem furo,
e furo de pasquim?!,
e pra que
essa casa assim,
cimento cem por cento,
gradil e porta de ferro,
se quem tem
direito a berro e grana
pra jogar o jogo
fica do lado fora?!,
agora,
se dana quem não tem,
por bagana
é tratado a ferro e fogo
e acaba entrando em cana!

sexta-feira, fevereiro 10, 2006

Não são apenas

Não são apenas
duras penas
que as trenas não medem,
não são loucuras terrenas
apenas
que nas arenas fedem,
não são impuras lenas
e hienas que procedem
apenas,
não são apenas
figuras obscenas
locando pequenas putas,
não são serenas criaturas
apenas
encenando cenas brutas,
não são amenas pinturas,
cantilenas lembrando lutas
apenas,
não, não e não!,
não é isso apenas...
são neuróticas madalenas,
exóticas garças-morenas
caóticas açucenas
que sobrevivem a duras penas,
não, não e não!,
não é isso apenas...
são Milenas,
algumas poucas,
que são mais Milenas
que a multidão
de Milenas loucas!

Juro que lhe diria tudo...

Juro que lhe diria tudo...
diria tudo
que soubesse de mim,
juro sim,
diria se soubesse,
mas não sei nada...
cada vez que assunto
e me pergunto
quem sou,
dou uma resposta
e bem diferente,
quando acho
que sei do ente
que há em mim,
que o suficiente
pra uma aposta
de mim sei,
nem passo rente,
quando reflito e acredito,
creio que tenho crença,
que sou um crente,
imediatamente
me vejo bem no meio
de uma descrença danada,
juro que lhe diria,
juro sim!,
mas,
pra lhe dizer,
seria preciso saber,
e ainda não sei nada de mim!

quinta-feira, fevereiro 09, 2006

Quebre lanças

Quebre lanças
pra botar fora esse lixo,
pra impedir o avanço
desse bicho
que devora você
e não se cansa
de não lhe dar descanso,
use seu estofo
pra se livrar desse ranço
que faz você se sentir
mixo e amargo,
que faz sua vida sem graça
se encher de traça e cupim
e emitir esse odor ruim
de bolor e mofo,
passe a passar ao largo
dessa mágoa doída,
dessa passada decepção,
deixe que se torne água
que já não move moinho,
quem sabe,
assim,
outra paixão
lhe atravessa o caminho?!

Não meta a mão em cumbuca

Meu amigo,
é verdade sim
que diz um antigo ditado:
“quem não arrisca não petisca”,
o refrém só não diz
que aí também mora o perigo!,
assim,
não meta a mão em cumbuca,
arapuca ou alçapão,
e podem ser isca
tutu, amizade e mulher,
portanto,
não seja afoito não
e tenha tanto cuidado
quanto puder
com armadilha em geral,
seja de fora ou de dentro,
destra ou sinistra,
até mesmo do centro,
afinal,
pode ser tudo teatro,
além do mais,
o quarenta e quatro
pode não ser o ideal
entre o oito e o oitenta,
eu escolho a olho
as quarenta ou quarenta e dois!;
depois,
não há nenhum mal
em usar arreio,
cilha, freio ou bridão,
se com eles
adestra as feras,
administra as quimeras,
e não esqueça
balança e medição,
que precisam ter
igual vulto
adulto e criança,
cabeça e coração!

quarta-feira, fevereiro 08, 2006

Vamos rodar

Vamos rodar
no rodar dessa roda
que roda e não pára
que não dá
pra parar a roda,
vamos rodar
no rodar dessa roda
que roda e não pára
que não dá
pra parar a roda,

vamos rodar roda afora
como roda o ponteiro
com o rodar da hora,
vamos rodar
como no mamoeiro
o mamão roda
na roda da estação,
como roda a criança
com o rodar do pião,
da piorra,
como o cata-vento roda
à cata de mais vento,
de mais roda,
vamos rodar
à moda da baiana
que se engalana
na roda de dança
com a saia cheia de roda,
vamos rodar
mais uma rodada,
rodada e meia,
mas sem pachorra,
sem tentar
um rodar mais lento,
sem o afã
de rodar mais que a roda,
que não roda a noite,
não roda a manhã,
nada,
niguém roda nesse mundo
nem um segundo antes,

nem um instante depois,
que não roda a noite,
não roda a manhã,
nada,
niguém roda nesse mundo
nem um segundo antes,
nem um instante depois!

terça-feira, fevereiro 07, 2006

Poxa!

Poxa!,
que mania:
deixar pra última hora
e fazer nas coxas,
em cima da perna;
e que filosofia!:
que se dane o mundo,
que se dane o avião,
que não sou piloto
nem me chamo Raimundo;
agora,
que senhora fotografia
do maroto-padrão nacional!,
um bamba no clima
da eterna emoção tropical,
futebol, samba, verão
e uma geladinha!,
que sem geladinha
não vai não;
como também
não é calça-frouxa
e tem as coisas roxas,
além de maroto,
é machão;
só não sei
se algum santo
vai fazer a tempo e a hora
o que já devia ter feito
e até agora não fez o maroto!,
só não sei
se algum santo
vai conseguir dar um jeito
nessa nossa pane atual
e tirar da enrascada o maroto!,
e acho
que a tal coloração
que ele diz ser de macho
é só efeito
de porrada ou de apertão!

Isso é que é peito!

Preste atenção no que digo,
não teste essa mulher,
você não tem noção
do perigo que ela é,
ela é da pá virada,
do agito e do pagode,
essa mulher
esquenta o peito
com uca e absinto
e não funde a cuca
nem sequer fica de bode,
enfrenta muvuca
no peito e no grito,
mata no peito confusão,
leva a peito arranca-rabo
e dá cabo de brigão,
perto dessa danada
comigo-ninguém-pode
é pinto,
essa danada
já tem muitos feitos,
já pegou na cama de jeito
muito machão,
passou o dito nos peitos
e acabou
com a fama do bambambã,
digo e não me acanho,
meu amigo,
não me assanho
com essa danada,
essa danada é da pá virada,
e o que não lhe falta é peito
pra encarar na marra
qualquer barra
e qualquer malta,
nem pra peitar sutiã
de qualquer tamanho!

Pra reduzir o risco

Pra reduzir o risco
de fazer besteira
e acabar errando o bote,
seja arisco,
não adote
a pressa como bandeira
e não entre nessa
de ir com muita sede ao pote,
quer dizer,
se puder caminhar,
não trote,
se puder trotar,
não galope,
se puder galopar,
voar não tope
que você não tem asa!;
aliás,
pra reduzir ainda mais
o risco de calote
em casa ou no negócio,
bisbilhote o quanto puder,
se abarrote de informação
e cada opção esgote,
saiba de antemão
qual é o mote do seu sócio
e preste atenção,
note e anote
o que arrota sua mulher,
caso arrote camarão
e você não tiver tutu
nem pra sardinha,
dê o fora na hora!;
e só mais uma coisinha,
se não tiver certeza absoluta
de que tem absoluta certeza,
não vote!

O veneno

O veneno circula
como um porre,
percorre o peito,
se acumula na mente
e escorre
feito risada tosca
ou fosca lágrima,
pura artimanha
da torrente de magma
fumegante e abrasador
que vem de entranhas
tão cheias de rancor,
pura artimanha
do magma itinerante
que corre por veias
sangrentas e indiferentes,
afluentes que não têm pejo
de deixar circular
o desejo de vingança,
mas,
à proporção
que o furor avança
o veneno se vai envenenando,
um dia,
quando a risada fosca
e a tosca lágrima,
quando o magma
resfria e se solidifica,
se petrifica o coração,
e não medra amor
em coração de pedra!

sexta-feira, fevereiro 03, 2006

Porta improvisada

Pela porta improvisada,
diante de um sol ainda frágil
sob o último vestígio da madrugada,
saímos da paixão,
deixando um beijo
perdido na esquina,
e saímos
sem aviso,
sem pranto,
sem palvras,
e falar era preciso,
só uma canção desafinada
com nossas sombras fazia par,
tudo era esparso,
tudo era indefinido,
tudo era gesto
de uma dança de despedida,
sem saber a razão,
me sentia aflito,
me afligia aquele instante
entre o silêncio da praça vazia
e a poesia incessante do mar,
não sabia
que estava aflito
que a aflição já sabia
que aquele afligir ia ser infinito!

Tá indo pro estaleiro

Se estiver no camburão
e não for policial,
se estiver na ambulância
e doutor ou enfermeiro
não for não,
companheiro,
não vou estranhar
se seu pessoal
estiver em pânico
em tal circunstância,
pois,
seria temerário
imaginar passeio
num raro
horário de recreio...
é claro
que você
pode ser mecânico
e estar testando o veículo,
mas,
sem prova em contrário,
e prova cabal,
tá indo pro estaleiro,
no cubículo ou no hospital!

quinta-feira, fevereiro 02, 2006

Agradeça de fato

Esqueça a retórica
da meteórica gratidão,
aquela oca e tão pouca
que se esvai
após cruzar o céu da boca,
quer ser grato?!,
agradeça de fato,
mereça quem lhe deu a mão,
se quiser dizer obrigado
e seguir com a antiga mania,
diga com arte e energia,
dê vazão
ao seu lado bizarro
e faça aquele espalhafato
que,
na maior parte,
é pura ejaculação precoce,
desafogo e pronto,
e ponto,
entre pigarros e tosses,
está cumprida a missão!,
mas se quiser ser grato,
agradeça de fato,
agradeça com o coração!

Que desassossego!

Que desassossego!,
quando creio
que vou
parar no emprego,
nego me dá um bico;
quando penso
em sossegar um tico
no chamego da nega,
chega a prole e perturba;
quando sou forçado
a botar de lado
o apego à vida
pra dar duro pelo pão
no meio da turba,
fico apavorado e tenso
porque não é mole
viver pedindo arrego,
fugindo de ladrão
e de bala perdida;
por fim,
quando sento na sala
e tento ter sossego
pra ler meu jornal,
é o jornal que não sossega,
o furo é chaga e sangra,
sangra de enxarcar os olhos...
e os olhos cega...
e tudo fica escuro,
na manchete,
o mal,
a praga
apaga a esperança,
se anuncia a peste
que nos espia
pela tela da tevê,
a epidemia que avança,
que investe pela internet,
e não vai resolver
fechar tranca, tramela,
janela e cortina,
que amargor, amargura, amaro dia,
que amaro dia, amargor, amargura,
a cada dia,
tudo custa mais caro,
tudo
ainda mais nos assusta;
que desassossego!,
parece que não há norte,
trincheira, forte, vacina
nem branca bandeira,
parece que nada espanca
esse desassossego!

quarta-feira, fevereiro 01, 2006

Viva o banquete!

Viva o frango assado
que pôs fogo na mesa,
apesar da tristeza
do marido frangueiro,
goleiro que foi traído no jogo;
viva o bolo de aniversário
com vela e enfeite,
apesar de ter sido
o que o namorado otário
havia acabado de levar dela;
viva o pepino
fatiado fino e com azeite
que veio com o rango,
apesar de ter rolado
rolo de pastel dentro da cozinha;
viva a batata quente,
pitéu temperado com coentro,
apesar de ter queimado
a mão daquela vizinha
que na gente só mete o cacete;
viva o croquete
tão apreciado quão picante
que engoliu a mocinha,
apesar de ter enjoado
todo dia desse dia em diante;
contudo
e apesar de tudo,
viva o banquete!

Tome um cuidado

Seja bruxo, alquimista,
insista e arrisque,
se ajeite
e aproveite o empuxo,
torça o real
e torça pela fantasia
de terça a terça
em horário integral,
se for necessário,
não se belisque
pra ficar acordado;
se tiver apostado,
pode ter sido até
no hóquei sobre o gelo,
sem garantia
e com o risco
de entrar numa fria,
tenha força até o final,
torça pelo seu palpite,
ponha fé na sua sorte,
mas,
seja forte,
faça esforço
e faça face
a apelo e atropelo,
evite
que alguém
passe do limite,
banque o disc-jóquei
e se abanque no seu dorso
à conta de tocar
seu disco invertebral
com tecnologia de ponta;
e sempre torça
pra não se arrepiar o pêlo
de quem você não queria
que ficasse arrepiado,
que arrepio trocado
dá calafrio;
torça e torça e torça
toque e retoque a vida,
mas,
tome um cuidado
com a magia,
não torça nenhum fato
nem se torça
pra praticar algum ato
se pela torcida
puder ser obrigado
a pagar o pato algum dia!